Aos pós-nascidos
(Bertolt Brecht) tradução Leonardo Gonçalves
Realmente vivo em tempos tenebrosos
Palavra despreocupada e tola
Uma testa sem rugas denota insensibilidade
Aquele que ri apenas ainda não recebeu a noticia terrível
Que tempos são esses que uma conversa a respeito de arvores
Quase é um crime porque envolve o silencio a respeito de tantas violações
Aquele que calmamente atravessa a rua não esta mais ao alcance de seus amigos
Necessitados
É verdade ainda ganho o meu sustento, mas acredite em mim isso é por acaso
Nada do que faço me da o direito de comer até estar satisfeito
É por acaso que sou poupado quando minha sorte falha estarei perdido
Coma e beba você se alegra pelo fato de ter
Mas como posso comer e beber quando arrebato do faminto o que como
O meu copo de água faz falta ao que morre de sede
Ainda assim como e bebo
Eu também queria ser sábio
Nos livros antigos está escrito que a sabedoria
Se manter fora das brigas do mundo e viver o curto tempo sem medo
Também sobreviver sem violência
Retribuir o mal com o bem
Não realizar, mas esquecer seus próprios desejos
É tido por sábio
Tudo isso eu não posso
Realmente vivo em tempos tenebrosos
As cidades vêm no tempo da desordem quando a fome governava
Entre os seres humanos vim no tempo do tumulto e me indignei com eles
Assim passou meu tempo que por sobre a terra me foi dado
Meu alimento comia entre as batalhas, me deitava pra dormir entre os assassinos
Do amor cuidava desatentamente e olhava para a natureza impacientemente
Assim passou meu tempo que por sobre a terra me foi dado
As estradas conduziam ao pântano no meu tempo
A língua me traiu ao carrasco fui capaz de pouco
Mas os que governo sem mim estariam mais seguros
Era a minha esperança
Assim passou meu tempo que por sobre a terra me foi dado
As forças eram poucas o alvo muito distante
Estava até plenamente visível ainda que para mim inalcançável
Assim passou meu tempo que por sobre a terra me foi dado
Vocês que emergirão do dilúvio de que nós submergimos
Lembrem-se quando falarem de nossas fraquezas
Também dos tempos tenebrosos dos quais escaparam
Passamos nós mais frequentemente do que os sapatos trocam
De países por guerras de classes desesperados
Quando sofrem injustiças e nenhuma indignação
E a gente sabe que também o ódio à baixeza destorce as afeições
Também a ira a injustiça torna a voz rouca
A nós que queríamos preparar o solo para a gentileza ao pudemos nós mesmos sermos gentis
Vocês no entanto quando a hora chegar que o ser humano seja ajudador do ser humano
Lembrem-se de nós com indulgência.